domingo, 13 de setembro de 2009

Real Combo Lisbonense: Um grupo que recupera canções de outros tempos

O Real Combo Lisbonense é o mais recente projecto do músico e artista visual João Paulo Feliciano. É também um grupo singular, entre o conjunto de baile e a banda pop, com um EP já editado




Algumas pessoas associarão o nome João Paulo Feliciano ao músico que, no final da década de 80, formou a primeira "all portuguese fake american rock'n'roll band", os Tina and The Top Ten. Outras pensarão no artista visual que expôs os seus trabalhos nos principais espaços de Portugal, e também em mostras e galerias estrangeiras. Mas não é esse passado ligado ao rock alternativo, ou um presente noutros campos artísticos, que começa a gerar algum burburinho. No centro das atenções encontra-se agora o Real Combo Lisbonense, inspirado nos conjuntos de baile que se ouviam nos anos 50 e 60.

"O Real Combo Lisbonense é um grupo com uma natureza própria e nova. É uma coisa algo híbrida, entre o conjunto de baile e a banda pop", explicava há dias João Paulo Feliciano no seu ateliê, um armazém em Lisboa que hoje serve de sala de ensaios para o grupo. E vai mais longe: "Até aparecermos não havia nenhum grupo com estas características."

De onde "aparece" então este grupo de baile, que recupera músicas que o público tinha esquecido há muito? "Isto começa tudo a ganhar forma no início do ano passado, só comigo e com o Mário, o meu irmão", avança. A ideia era fazer em Portugal aquilo que a Orquestra Imperial fazia no Brasil. E tinham duas opções: "recorrer a músicos contratados" ou formar "um grupo a sério". Optaram pela segunda. João Leitão, dos Irmãos Catita, foi então o primeiro músico contactado pelos irmãos Feliciano. Alguns meses depois, o conjunto contava com 11 elementos.

Antes, porém, Feliciano já tinha começado a escolher as canções que iam tocar. "Este universo da música portuguesa dos anos 50 e 60 não me era estranho", afirma. "Sempre fui ouvindo e coleccionando algumas raridades, se bem que nunca o tinha feito de uma forma sistemática e intensiva." Surgia então um primeiro problema. "Em Portugal produziu-se pouco e a qualidade era baixa, portanto, são poucos os exemplos interessantes. E dá trabalho encontrá-los."

Apesar das dificuldades, o Real Combo Lisbonense já tem perto de 25 temas no seu repertório, e vão começar a trabalhar em mais cinco. "Acho que vamos chegar aos 100 temas à vontade", avança, confiante. A palavra "repertório" deve ser sublinhada. Quem o diz é o próprio intérprete. "O nosso objectivo é tocar músicas que fazem parte de um património, de um repertório comum. Que eu toco de esta maneira e tu tocas de outra", reflecte. "É isso que eu quero, e é por isso que daqui a 20 anos podemos estar a tocar versões de músicas que estão a ser feitas agora".

Hoje, contudo, o grupo limita-se a entoar músicas escritas entre as décadas de 50 e 60, um período sobre o qual paira a sombra do Estado Novo. "Espero que, no âmbito da música, o Real Combo Lisbonense ajude a alterar essa relação mal resolvida com o nosso passado. Não precisamos de o renegar, nem de o glorificar. Precisamos de o assumir", dispara. "Nem tudo aquilo que se surgiu nessa altura deve ser posto de lado", diz. "Seja a bolacha Maria, sejam as músicas do Mário Simões e de tantos outros".

Curiosamente, e apesar de não ter concertos agendados, à partida a banda não recusa propostas. "É preciso um serviço, nós estamos aqui. Porque não havemos de tocar num casamento? Só depende do facto das pessoas estarem dispostas a pagar, e das condições apresentadas". Até porque, como diz Feliciano, no fundo "isto é só musica para as pessoas ouvirem, se divertirem e dançarem".


in DN online, 13-9-2009


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